segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Pela família, contra governo "ateu", atrás de votos

Católicos saem em defesa da "família tradicional". Igreja reproduz discurso de partido da oposição.

Num país cuja legislação sobre costumes tornou-se uma das mais liberais do mundo -- a Espanha -- milhares de espanhóis demonstraram a força do conservadorismo católico numa manifestação gigantesca contra o governo do premiê social-democrata José Luis Rodriguez Zapatero, informa o jornal inglês The Independent. (Aqui em Pindorama, nossos jornais e TV's nada nos disseram sobre este fato)

A concentração "Por la familia cristiana", segundo cálculos do jornal espanhol El País um contingente em torno de 160 mil pessoas aglomeradas na praça Colón de Madri, protestava contra o governo "ateu" de Zapatero em função da aprovação do casamento gay e da simplificação do divórcio. Direto da praça São Pedro, no Vaticano, os espanhóis assistiram num enorme telão, o papa Benedict XVI afirmar:

"Baseada na união indissolúvel entre o homem e a mulher, [a família] representa o local privilegiado em que a vida humana é bem-recebida e protegida desde o início até o seu fim natural. Vale a pena lutar pela família e pelo casamento, porque vale a pena lutar pelo ser humano, o ser mais precioso criado por Deus".

Para o presidente da Conferência dos Bispos da Espanha, Ricardo Blazquez, dizia-se que a "família tradicional" era um anacronismo, porém, ele fez questão de ressaltar que a "família tradicional está enraizada na natureza humana e sua validade é um fato de ontem, hoje e amanhã". Já o arcebispo de Valência atacou a "cultura do secularismo", para ele, "uma fraude que conduz ao desespero pelo caminho do aborto, do divórcio express e das ideologias que pretendem manipular a educação dos jovens".

O secretário de Organização do PSOE, José Blanco, partido do premiê Zapatero, pediu uma retificação a Igreja Católica devido a afirmação feita por seus representantes de que o governo espanhol estaria dando marcha a ré no que diz respeito a Declaração dos Direitos Humanos. Acrescentou o secretário que a concentração tratou-se de um ato do Partido Popular, "presidido por uns cardeais" e que, há dois meses das eleições gerais, a Igreja reproduzia o mesmo discurso do PP, numa "intromissão na campanha eleitoral".

Conforme o Ministro da Justiça espanhol, Mariano Fernández Bermejo, o "nacionalcatolicismo" entrou na campanha eleitoral pelas mãos de sua hierarquia eclesiástica e da direita mais reacionária, lançando mensagens "coincidentes com as conhecidas teses defendidas pelo Partido Popular".

País de maioria católica, parece legítimo que os adversários da união civil entre pessoas do mesmo sexo e da dissolvição do casamento, manifestem-se publicamente. Afinal, para estas pessoas, o casamento deve unir, para sempre, homens e mulheres. E somente. Para elas, tais medidas conspiram para a destruição da instituição familiar e devem ser revogadas.

Não pode ser alimentada, contudo, a ilusão de que 100% dos católicos na Espanha apóiam a manifestação da praça de Madri. Hoje, muitos dos que se dizem católicos, no que se refere a questões de foro íntimo, pensam e agem contrariamente às determinações do Vaticano.

Convém perguntar ainda se é justo que um casal permaneça unido quando o amor já não mais o liga. Sabe-se de muitas uniões conjugais em que o "amor" não estava na base do mesmo desde sua formação. Casamentos arranjados, obrigados, contratados.

Casais gays anunciam novas e possíveis configurações familiares. Os homossexuais têm os mesmos direitos que os heterossexuais "normais" a constituir família.

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